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A sentença do futuro será high-tech ou poética?

Foto do escritor: Ana Beatriz Araújo CerqueiraAna Beatriz Araújo Cerqueira

Sentença aqui, acórdão ali, decisão de turma acolá e o legal design encontra seu lugar no judiciário. O que, à primeira vista, muito me surpreende. Sempre achei que esse seria um movimento que viria do extrajudicial e aos poucos fosse migrando para as petições e para os gabinetes. Primeiro, na minha cabeça, seriam os contratos. Depois, petições mais enxutas. E por último, lá bem por último, seriam as sentenças. A quebra dessa expectativa, que era mesmo bem infundada, me faz pensar que, bom, no fim das contas esse é um mundo que implora novidades. Em todos os âmbitos. Em todas as práticas. Nas empresas, escolas, escritórios e também, é óbvio, nos gabinetes.

Tenho um apreço indizível por gabinetes. Quase toda a minha prática jurídica se deu em um. E minha prática diz muito da minha formação. Quando falo de direito em tons de rosa também me refiro aos incontáveis processos previdenciários - e, portanto, rosas - que toquei, analisei, carimbei, assinei e minutei despachos, decisões, mandados e acórdãos. A experiência em um gabinete é o contato com a justiça crua. É entender o tempo do processo, a qualidade das atuações, os esforços empreendidos. A máquina por dentro. E é extremamente diferente do escritório.


Tive a oportunidade de depois ir fazer estágio em um dos escritórios que antes eram objeto do meu olhar como estagiária do judiciário. E a experiência de trocar de pólo foi incrível. Tudo ganhou outros contornos. E muitas das falhas que eu via de um lado, passei a ver do outro. No gabinete a gente não precisava esperar horas pra falar com alguém do INSS para conseguir uma informação - e isso representava um desgaste terrível no trabalho de escritório. A despreocupação que os agentes do judiciário tinham com o repasse de informações - banais que fossem - vistas do lado do advogado representavam uma dor que dali de dentro da secretaria eu jamais sentiria.


Porque o lado do advogado é diferente. É o lado do humano visceral, que tem fome, pressa, que se estressa, liga chorando, tem seu número no WhatsApp e manda mensagem de madrugada. É o lado do profissional que ganha pouco pra trabalhar muito, sem perspectivas maiores e sempre com medo de ser o próximo a ser dispensado. Muitas vezes sem ter seus direitos básicos assegurados, submerso em condições indignas de trabalho em termos de carga horária, retribuição financeira e também de trabalho emocional - podemos falar mais sobre isso depois, é claro.


A pressão é terrível em ambos os lados e a sobrecarga de trabalho e de responsabilização é quase que constitutiva. A exigência de profissionalismo, seriedade, pontualidade e acurácia é a mesma. E as pessoas mais bonitas, inteligentes e profissionais que conheci ocupavam ambos os lados. É por isso que eu acho o direito bonito. Talvez porque tive essa sorte de me deparar com gente bonita que faz direito. Talvez pelo impacto que tenha percebido que ele faz na vida das gentes, sobretudo quando pautado por uma atuação humanizada. Talvez por essa minha mania de ver beleza na rudeza. Mas é o que eu acho. E ver esse direito se deixar permear por coisas que acho ainda mais bonitas, como é o caso do legal design, é uma área de respiro, é meu espaço de construir certezas e predições de futuros.


Então, feitas as preliminares, vamos lá, à pergunta que ilustra esse texto - que é no fundo desabafo, sempre desabafo: a sentença do futuro será high-tech ou poética? Quer saber de onde tirei isso? Bom, lá vai:

Seguem as provas:

Juíza usa poesia para determinar que filhos deem alimentos à mãe de 91 anos e cadeirante: ‘Mãe não morre nunca'
Juíza usa poesia para determinar que filhos deem alimentos à mãe de 91 anos e cadeirante: ‘Mãe não morre nunca'

Caríssimos leitores, sinto pelo constrangimento de sempre. Esse é um blog de legal design que se propõe constrangedor em suas proposições poéticas, em suas utopias de direito e linguagem. Que abdica de qualquer pretensão de neutralidade e diz a gritos que espera, sim, um novo mundo. E que se propõe aberto a esse novo mundo, que até pode ser high-tech, desde que seja também poético. Esse é o meu ponto.


Coraci Pereira da Silva é a magistrada que proferiu a sentença. E uma busca rápida no Google nos direciona a uma outra notícia, que contra d'uma outra história da Dra. Coraci, excelentíssima e humaníssima. E a história diz assim:

“O que realmente tem valor é o afeto que trazem no coração”. Foi com esta frase que Coraci Pereira da Silva, Juíza de Direito na Vara de Família e Sucessões da Comarca de Rio Verde (GO) e membro do IBDFAM, proferiu sentença que determinou o reconhecimento de filiação socioafetiva entre avô, filhos e netos.

A Dra. Coraci me diz mais sobre o legal design que eu quero ver por aí do que todos os outros. E que me perdoem todos os outros. São belíssimas todas as tentativas. Mas a subversão da linguagem e a inclusão do poético realmente me pautam. Uma juíza que fala de corações. Uma sentença que exprime a importância dos afetos. É sobre isso. Muda o eixo. Inicia um debate pautado em outra narrativa. Não precisa enfeitar com mais nada. Não consigo imaginar nada que possa - ou ao menos deveria, dentro da minha utopia - tocar mais as pessoas. Nada que deixe o humano mais ao centro. Fico imaginando a minha avó - minha famosa avó - lendo uma sentença que tem um poema. E ela entenderia. Como não entenderia outras maledicências e covardias tecno-jurídicas, mesmo que coloridas, 'inda que cor-de-rosa.


Quando digo que design é sobre relação, digo a sério. O direito é sobretudo linguagem, e aqui é sempre preciso lembrar Bourdieu (1977): "o poder da palavra é o poder de mobilizar a autoridade acumulada pelo falante e concentrá-la num ato linguístico". E não vou citar Paulo mais uma vez, mas vocês já sabem. Eu adoro os elementos gráficos. Sou suspeita pra falar. Mas quando pensamos em design como relação, como propõe Landim, a gente consegue abstrair da forma e entender o movimento. E, observando o movimento, consegue ver a cadeia de mudanças. É nesse sentido que digo que a Dra. Coraci, pra mim, foi a maior legal designer do judiciário de 2021. Embora não tenha utilizado elemento gráfico nenhum. Porque propõe uma subversão que elemento gráfico nenhum permite. Porque inclui o poético como possibilidade. Porque fala dum lugar de quem tem coração e entende de corações e é, portanto, humano.


O legal design que eu acredito é um movimento teórico e cientificamente embasado que se pauta, sobretudo, na inclusão do humano como centro do sistema de justiça. É um movimento global, que vai muito além de tentativas de defini-lo em legendas de Instagram e posts de blog como esse. Como movimento de humanização, independe do manejo de técnicas de design gráfico. Porque é sobre gente, não sobre as coisas. É, sobretudo, uma proposta de inovação do direito através da sua humanização (isso é Hagan). E não há caminho melhor pra isso do que o poético, do que a arte, do que a linguagem, do que o design, seja gráfico, de serviços, de experiência.


A inovação me encanta porque, apesar de abraçar metodologias, é sempre anti-fórmula, é sempre uma forma de interferir no status quo (isso é Tim Brown, que fique claro), ou seja, uma maneira de dar outras formas àquilo que está posto. E a forma é importante, é claro, a gente adora. Mas não sustenta o movimento. É preciso ir além. É preciso ser humano. O advogado do futuro pode ser um robô, mas também pode ser um advogado com garantia de direitos trabalhistas e condições dignas de trabalho. Cabe a nós ocupar esse espaço e decidi-lo. Uma sentença pode ser um espaço de abstrações gráficas mais ou menos complexas, com maior ou menor grau de "adequação estética", ou um recurso que realmente atinja o humano em termos de comunicação efetiva. Isso vale para contratos, petições e coisas tais.


E pra você: a sentença do futuro será high-tech ou poética?

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Ana Beatriz

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PERGUNTAS FREQUENTES

Fundamentos do Visual Law e Legal Design

  1. O que é Legal Design e Visual Law?
    Legal Design e Visual Law são metodologias que unem Direito, design e tecnologia para criar documentos jurídicos mais claros, visuais e acessíveis.

  2. Qual a diferença entre Legal Design e Visual Law?
    Enquanto o Legal Design foca na experiência do usuário ao interagir com soluções jurídicas, o Visual Law aplica elementos visuais para tornar documentos legais mais atraentes e compreensíveis.

  3. Como o Visual Law é aplicado em petições?
    No Visual Law, petições incluem gráficos, fluxogramas e elementos visuais que explicam argumentos de forma clara e estratégica, melhorando a comunicação com juízes e partes envolvidas. Você pode encontrar templates prontos no Legal Design Movement.

  4. Quais são os exemplos de Visual Law na prática?
    Contratos com ícones explicativos, petições com infográficos, manuais jurídicos interativos e apresentações visuais de cláusulas contratuais. Baixe modelos gratuitos no Legal Design Movement.

  5. Documentos em Visual Law são aceitos pelos tribunais?
    Sim, respeitendo os requisitos formais exigidos pelo tribunal e melhorem a comunicação do caso.

Ferramentas e Recursos para Visual Law

  1. Como criar petições em Visual Law no Word?
    Você pode usar ferramentas do Word, como gráficos, SmartArt e tabelas, para estruturar informações visuais. No Legal Design Movement, você encontra templates prontos para Word que facilitam o processo.

  2. Existe um kit ou pacote de Visual Law para iniciantes?
    Sim, no Legal Design Movement, oferecemos um conjunto completo de templates gratuitos em Word, Canva e PowerPoint.

  3. Quais são as melhores ferramentas para Visual Law?
    Além do Word, ferramentas como Canva, Figma e Adobe Illustrator são populares. No Legal Design Movement, há materiais gratuitos para iniciar o aprendizado.

  4. Como o Canva pode ser usado no Legal Design?
    O Canva é ideal para criar documentos visuais com facilidade. No Legal Design Movement, você pode baixar templates personalizáveis para começar.

  5. Posso criar documentos jurídicos visuais sem conhecimentos de design?
    Com ferramentas amigáveis e templates prontos disponíveis no Legal Design Movement, é possível criar documentos visuais eficazes, mesmo sem experiência.

Educação e Cursos

  1. Onde encontrar cursos de Legal Design e Visual Law?
    Além de instituições como Bits Academy e Future Law, o Legal Design Movement oferece recursos e materiais introdutórios.

  2. Existe algum curso gratuito de Legal Design?
    Sim, o Legal Design Movement oferece conteúdo gratuito, incluindo templates e guias práticos.

  3. Curso de Legal Design vale a pena?
    Sim, alguns cursos ensinam habilidades práticas que ajudam a melhorar a comunicação jurídica e aumentar a eficiência.

  4. Quais são os melhores cursos online de Visual Law?
    Future Law e Bits Academy são referências. No Legal Design Movement, você encontra materiais que complementam o aprendizado. Outros blogs, como Bernardo Azevedo são boas fontes de atualização.

  5. É possível aprender Legal Design sozinho?
    Sim, com recursos online, vídeos no YouTube e o suporte do Legal Design Movement, é possível começar a explorar o tema.

Casos e Aplicações Práticas

  1. Como o CNJ utiliza Visual Law em processos?
    O CNJ aplica Visual Law para simplificar dados estatísticos, apresentar relatórios e melhorar a transparência na comunicação com a sociedade.

  2. O Visual Law pode ser usado em processos administrativos?
    Sim, é amplamente utilizado por órgãos como a AGU para criar documentos acessíveis e claros.

  3. Quais são os principais documentos criados com Visual Law?
    Petições, contratos, manuais de compliance e relatórios jurídicos estão entre os documentos mais comuns. Veja exemplos no Legal Design Movement.

  4. Como o Visual Law ajuda advogados?
    O Visual Law melhora a comunicação, economiza tempo e torna documentos mais persuasivos e impactantes.

Inovação no Direito

  1. O que significa Visual Law?
    Visual Law é a aplicação de elementos visuais no Direito para tornar informações legais mais acessíveis e fáceis de entender.

  2. Por que Legal Design está em alta?
    Com a digitalização e o foco no usuário, o Legal Design se tornou uma ferramenta essencial para inovar e melhorar a eficiência no Direito.

  3. Como o Design Thinking é aplicado no contexto jurídico?
    O Design Thinking ajuda a criar soluções centradas no cliente, como contratos claros e processos simplificados.

  4. Quais são os desafios de implementar Visual Law?
    Os desafios incluem resistências culturais no setor jurídico, a necessidade de aprendizado de ferramentas e a adequação às normas formais.

  5. O Visual Law pode transformar o futuro do Direito?
    Sim, ele tem potencial para democratizar o acesso à justiça, melhorar a eficiência e aproximar os profissionais do Direito das necessidades da sociedade.

© 2021 por Ana Beatriz Cerqueira. Uberlândia/MG. 

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