(um outro manifesto) Pela desmoralização do direito
- Ana Beatriz AraĆŗjo Cerqueira
- 30 de mai. de 2021
- 4 min de leitura
Atualizado: 31 de mai. de 2021
- à vida futura! Nós te criaremos.
Carlos Drummond de Andrade
Esse é um texto sobre cidadania. Escrevo, então, como cidadã. Posição que me foi conferida lÔ pelos idos de 88, nisso que chamamos Constituição. E que me dÔ todo o direito de estar com raiva. Como (quase) jurista não, porque jurista tem essas coisas todas de "data vênia", "ai mais isso, ai mais aquilo", "ai fulano", "ai palavrão". Eu falo como cidadã. Até porque essa coisa toda de legal design, e peço perdão aos diplomados do clube e de fora do clube, é só sobre isso.
Outros tempos, jovem estudante de direito, eu saĆa romĆ¢ntica pelas ruas perguntando se as pessoas sabiam o que era a Constituição e me diziam assim de volta: "Construção?!". Na Universidade Federal de UberlĆ¢ndia criamos um projeto em 2016, chamado "Constituição na Escola". Tudo que eu sei, penso e entendo sobre o que chamamos de "legal design" comeƧou ali. Esse foi o meu curso de "legal designer". Embora ainda nĆ£o soubĆ©ssemos o nome - e eu lamento muito por esse problema dos nomes, por essa necessidade de se apegar/apoderar dos nomes. E talvez por isso eu nĆ£o sinta medo quando recebo alguma carteirada de "legal designers" que jĆ” aplicam isso hĆ” tantos ou tantos anos e fizeram nĆ£o sei o que no nĆ£o sei aonde. Porque eu sinto que: eu tambĆ©m. Embora a pouco tempo tenha aprendido o nome. E nĆ£o estou falando isso por mim. Falo por todos aqueles que nĆ£o sabem os nomes, mas fazem as coisas. E Ć s vezes de forma muito mais estruturada que quem sabe o nome ou pagou o curso. Isso, enfim, Ć© sobre um chamamento: apropriem-se do nome. Ć assim que eles fazem.
No Constituição, Ćamos nas escolas pĆŗblicas de UberlĆ¢ndia e regiĆ£o explicar alguns conceitos da Constituição e o que era a Constituição. E o fato Ć© que muitos, a imensa maioria, nunca tinham ouvido falar nisso. A minha primeira solução de design jurĆdico (e nĆ£o me chamem decolonial só por traduzir o nome, isso Ć© pecado), com certeza, foi a caixinha de explicar "poderes", onde colocĆ”vamos papeizinhos com as "competĆŖncias". Ilustro:

Era assim que eles entendiam. AtravĆ©s do jogo. Do toque. Da palavra. Do olhar no olho de gente jovem que nem eles. Da mesma constituição racial e do mesmo histórico de vida e famĆlia que eles - e tambĆ©m talvez essa seja uma grande questĆ£o, esses novos estudantes de direito, essas novas caras do direito que povoaram as instituiƧƵes de elite nos Ćŗltimos tempos. Uma professora - Dra. CĆ¢ndice LisbĆ“a - que se colocava como eles e se sentava no chĆ£o com eles - e nisso, eterna a minha admiração por ela.
Era assim, por tudo isso, que eles saĆam dali apreendidos desse grande conceito: o Estado, seus poderes, que ao mesmo tempo Ć© uno e subdividido, cada qual com suas competĆŖncias. Passar slide nem dava, nĆ£o tinha datashow no Monte Hebron. NĆ£o adiantava jogar um livro para lerem, por mais bem escrito que o fosse, por mais legal design que tivesse. Por mais erudito, culto. E eu nĆ£o paro de pensar em Sophia: "Ć sĆ”bio hĆ”bil arguto informado/ PorĆ©m quando ele escreve/ As MĆ©nades nĆ£o danƧam". NĆ£o provoca emoção, nĆ£o mobiliza afeto, todo esse vocabulĆ”rio do XXI que a gente bem sabe ou jĆ” deveria saber, pelo amor da deusa (3).
Outro dia falava de comunicação cientĆfica. No Lab. de Direito & Design da UFU estamos com esse desafio: transpor os muros da Universidade, os famosos muros da Universidade. E aĆ entra a grande questĆ£o que se fazem todos os professores universitĆ”rios da atualidade: Ć© pra virar blogueiro? Ć pra escrever história em quadrinhos invĆ©s de teoria? Fazer podcast invĆ©s de evento? Ć pra acabar o livro? Ć pra fazer e-book? E todo mundo se olha assim com cara de nĆ£o sei, nĆ£o entendo, nĆ£o dĆ” pra saber, ninguĆ©m sabe. Mas todo mundo sabe que nĆ£o Ć© sobre isso, Ć© uma outra coisa. NĆ£o Ć© uma substituição, mas um andar ao lado. E um andar ao lado que potencializa, que transforma, oxigena. O coração crescendo dez metros e explodindo de Drummond. O rizomĆ”tico do professor Dorival da Unesp. O nĆ£o-afirmar culturas do Pedro. EntĆ£o, calma, LĆŖnio. TĆ” tudo bem. Exceto talvez por uma coisa. E isso a gente vai ter que conversar. E aĆ entra o ponto em que eu prego a desmoralização do Direito. E desse direito, em especĆfico:

"Quer dizer que o Direito deve ser ensinado ou explicado para qualquer pessoa entender"? Sei lƔ, nƩ. Vai que.
"PrĆŖmio Nobel para o Brasil". Olha bem, isso nem Ć© sobre Brasil.
Mas foi isso daĆ que me faz parar e pensar: e se o direito for explicado para qualquer pessoa entender? O que Ć© que acontece? O que Ć© que mobiliza? Que medo Ć© esse?
E se a gente fizer uma sentenƧa que o jurisdicionado entenda? Um sistema de acompanhamento processual intuitivo? O que Ʃ que acaba?
Se a gente comeƧa a falar de design de sistema de justiƧa, a breguice das togas dos magistrados, o ridĆculo das salas de audiĆŖncia, o fator excludente da linguagem dos juristas, quem Ć© que a gente ameaƧa? Ć tĆ£o grave assim? A ponto de desmoralizar esse arauto da moral-erudição-decoro-sei-lĆ”-que-outra-coisa?
Vou aproveitar pra postar essa foto que tirei na JustiƧa Federal, estagiƔria que era. Olha e me diz: isso te lembra o que? Te leva pra onde?

Lênio, a gente podia mesmo fazer legal design do seu livro. à um grande livro. Mas pra gente fazer isso ainda precisa fazer legal design de muita coisa antes. Começando por Gnerre, Marcos Bagno, Paulo Freire. Rubem Alves. Sabia que a inteligência artificial tÔ desenvolvendo empatia? Vêm os primeiros sinais. Até então eu não tinha colocado assim tanta fé, mas agora, essa história de empatia... Acho que talvez, daqui um tempo, eu prefira mesmo ser julgada por um robÓ.

Vou encerrar desenhando, né. Que é só isso que eu sei fazer. E umas fotos do Constituição na Escola, que levava estampado na camisa, olha só, também uma frase de Rubem Alves.
à isso. Até a próxima!
P.s.:
"Porque a gente encontra um bando de sujeitos pelo caminho que é a favor da transformação radical da sociedade, mas que nessa hora tem nostalgia do 'a mim se me afigura'. Que é nostalgia de classe, no fundo a nostalgia da linguagem é a nostalgia de classe, o gosto de classe".
Paulo Freire, em entrevista concedida a Virginia Maria de Figueiredo e Silva e TĆ¢nia Maria Piacentini.
















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